É muito complexa operação de logística por trás de uma compra na internet.
Fechar uma compra pela internet é uma operação relativamente simples. Escolhe-se o produto, preenchem-se alguns dados e a mercadoria chega à porta de sua casa alguns dias depois - seja em São Paulo, seja no interior do Piauí. Por trás dessa comodidade toda, no entanto, está uma das mais complexas operações possíveis no mundo da logística. O clique do internauta na tela do computador desencadeia uma série de operações que exigem uma engenharia capaz de fazer o produto - um simples CD ou um notebook de última geração - chegar de forma segura e no menor tempo possível à casa do cliente. Para que a entrega aconteça, dezenas de profissionais, às vezes centenas deles, são mobilizados numa corrida frenética que não tem similar. A razão para esse frenesi é simples. Em contratos normais envolvendo empresas de logística, é possível saber com certa antecedência para onde a carga vai e a que horas deve sair. No caso das compras eletrônicas, a previsibilidade é quase nula. A partir do momento em que a compra é realizada, começa uma corrida contra o tempo. "O comércio eletrônico é a expressão máxima da inteligência estratégica que envolve um trabalho de logística", afirma o professor Alberto Luís Albertin, da Fundação Getu lio Vargas.
Nessa gincana contra o relógio, uma das empresas que mais se destacam é o Submarino, um dos líderes do comércio varejista virtual no Brasil com faturamento anual de 574 milhões de reais. Como se verá, o Submarino é, acima de tudo, uma empresa de logística. Diariamente, a companhia processa cerca de 15 000 pedidos. É uma enormidade. Numa comparação livre, corresponderia ao trabalho de 100 operadoras de telemarketing trabalhando 24 horas por dia e com uma excepcional média de 10 minutos gastos por atendimento. Apesar desse grande volume, o método de trabalho criado pela empresa possibilita que, aproximadamente, 90% desses pedidos sejam entregues num prazo máximo de um dia (isso se a encomenda for feita da região metropolitana de São Paulo). Como eles fazem isso? Elementar. Depois que o consumidor fecha a compra, entra em cena uma máquina de guerra. São mais de 300 funcionários envolvidos em tarefas que incluem a captação do pedido, a localização do item desejado, a retirada da prateleira, o processo de embalagem e o envio até a residência do cliente. A complexidade aumenta porque são quase 700 000 itens no catálogo do Submarino.
O primeiro passo desse processo é dar uma "identidade" ao pedido. Logo que a compra é processada, emite-se uma nota fiscal com os dados pessoais do consumidor e as especificações da mercadoria. Trata-se de uma espécie de certidão de nascimento da encomenda, algo que vai acompanhá-la até o final da jornada. A nota fiscal é então enviada pelo sistema aos computadores do centro de distribuição da empresa, estrategicamente localizado em Osasco, cidade da Grande São Paulo próxima à rodovia Castelo Branco e à Marginal Pinheiros. O prédio impressiona pelas dimensões: pé-direito de mais de 10 metros de altura e área de 35 000 metros quadrados, o equivalente a quatro campos de futebol. No total, a capacidade de armazenamento é de 800 000 produtos.
É no meio desse gigantesco armazém que pulsa o coração de uma loja virtual. Durante 24 horas por dia, de domingo a domingo, centenas de funcionários correm de um lado para o outro em meio a pilhas de caixas abarrotadas de produtos. Nada lembra mais o trabalho realizado por formigas ou abelhas que a segunda parte da operação: a localização e a retirada do produto das prateleiras. Com o auxílio de empilhadeiras, alguns desses funcionários passam o dia esvaziando e recolocando mercadorias nas prateleiras, num ciclo sem fim. O movimento incessante é controlado por computadores, que analisam o fluxo de vendas, informam onde cada mercadoria está estocada e acompanham todos os estágios do processo. Tal operação é repetida 15 000 vezes por dia. "Esse trabalho requer brutal planejamento e uma estrutura que deve funcionar sem falhas em todas as suas etapas", diz Armando Marchesan Neto, diretor de operações e logística do Submarino.
Atualmente, cada pedido é feito separadamente, o que torna a operação um pouco mais lenta. Nas próximas semanas, o Submarino deve mudar esse sistema. Com investimentos de 4 milhões de reais, a empresa trará ao país um novo equipamento que tornará mais veloz a separação e a classificação dos pedidos. Com o novo modelo, todos os produtos serão separados por lotes, em vez de unitariamente. Isso significa que o operador não precisará ir várias vezes a uma mesma prateleira do estoque - um avanço e tanto considerando que, somadas, as prateleiras alcançariam 25 quilômetros de extensão. "O funcionário sairá uma única vez para separar toda a quantidade necessária referente a um conjunto de pedidos", diz Marchesan Neto. Depois de separado, o produto vai para o departamento de empacotamento e segue em esteiras para a última parte do processo: o envio. Essa etapa é terceirizada. O Submarino é atendido por 12 empresas, sendo que três delas possuem unidades dentro do próprio centro de distribuição do cliente.
Há cinco anos, o comércio eletrônico vive um período de forte expansão no Brasil. Em 2005, o negócio faturou 2,5 bilhões de reais, um crescimento de 43% sobre o ano anterior. Proje ções indicam desempenho ainda melhor em 2006, com receitas da ordem de 3,9 bilhões. Desde 2001, o varejo eletrônico cresceu 355%. É verdade que os indicadores ainda são tímidos se comparados aos dos Estados Unidos. Lá, apenas as vendas de roupas pela internet movimentam 11 bilhões de dólares por ano. Sem contar o setor de viagens, os consumidores americanos compraram no ano passado o equivalente a 82 bilhões de dólares pela internet, 24% mais que em 2004. No Brasil, problemas de infra-estrutura prejudicam a expansão do setor. Um deles é o custo do frete. Estudos indicam que os custos brasileiros somam 7,7% do PIB, ante 5% dos americanos.
Nenhuma empresa simboliza tão bem essa pujança americana como a Amazon. A varejista mais conhecida da internet é um gigante com vendas anuais de 10 bilhões de dólares. Em Nova York, cada cliente recebe os livros que compra na Amazon no mesmo dia e de graça. Só para efeito de comparação, a Amazon tem um centro de distribuição que é quase o triplo do Submarino e registra 2 milhões de pedidos ao dia. Agora, a empresa prepara um salto no que os especialistas chamam de logística digital, uma tecnologia ainda incipiente que começa a ganhar musculatura com a venda de arquivos de música e vídeo pela internet. Aguarda-se para breve o lançamento, pela Amazon, de um serviço para baixar filmes e programas de televisão. Nesse caso, o desafio será como garantir que o produto chegue às mãos de quem o comprou, sem distribuição de cópias ilegais no processo.
O Brasil está num estágio anterior. E isso tem mais a ver com a falta de maturidade desse mercado do que com ausência de iniciativas por parte do empresariado. O sistema de entregas do Pão de Açúcar pela internet ilustra com perfeição essa dificuldade. São dez anos de funcionamento (e várias reestruturações) no negócio de delivery. A idéia parecia simplesmente genial. Proporcionar ao consumidor fazer as compras de casa sem precisar ir até o supermercado. O problema é que essa operação exige altos investimentos em logística e o resultado até pouco tempo não tinha sido satisfatório. Em boa parte, devido à desconfiança dos clientes. Não só em relação à transmissão de dados de cartão de crédito pela internet como pela qualidade dos produtos entregues. Os consumidores esqueciam o comodismo para poder escolher a própria alface ou as batatas que gostariam de levar para casa. Mesmo assim a operação vem crescendo. Em 2005, o aumento das vendas foi de 25% em relação ao ano anterior.
Depois de várias investidas, o Pão de Açúcar descobriu a receita de como entregar produtos congelados, gelados ou secos ao mesmo tempo. Atualmente, a rede oferece na internet 12 000 dos 18 000 itens vendidos em suas lojas reais. Por mês, recebe virtualmente 25 000 pedidos, com cerca 120 itens cada um. Para garantir a qualidade do serviço, os 56 caminhões da frota foram adaptados para acondicionar produtos perecíveis sem danos. A previsão de saída dessa frota é sempre às 6 horas do dia seguinte ao pedido. Durante a noite, itens como carnes, iogurtes e verduras são embalados em horários entre meia-noite e 4 horas da manhã. As folhagens são acondicionadas quase na mesma hora da saída do transportador. "O negócio de alimentos na internet é estratégico para o grupo no longo prazo", afirma Alexandre Luiz de Lima, coordenador de comércio eletrônico do Pão de Açúcar. "Temos de acompanhar as mudanças de hábito do consumidor." E rapidamente, sempre rapidamente.
Expansão virtual
# Os dados mostram o crescimento do comércio eletrônico no país
# Segundo a Associação Brasileira de Logística, todos os segmentos existentes dentro do comércio eletrônico representam hoje cerca de 10% do mercado de logística no país
# Enquanto o mercado de encomendas tradicionais deve fechar 2006 com crescimento de 14%, as entregas para o comércio eletrônico devem avançar muito mais no mesmo período: quase 85%
# Em 2005,o comércio eletrônico faturou 2,5 bilhões de reais, um crescimento de 43% sobre o ano anterior. Projeções indicam um desempenho melhor em 2006,com receitas da ordem de 3,9 bilhões
Portal EXAME
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