Portal corporativo e gestão do conhecimento
Nove passos para promover esta união.
A empresa onde você trabalha está começando a falar em construir um portal corporativo? Fala em gestão do conhecimento (GC)? Já há um projeto em andamento neste sentido? Você está de alguma forma envolvido diretamente com isso? Então já é hora de ter clareza a respeito do que é realmente importante saber para adentrar este novo mundo.
Mesmo que estes temas ainda não estejam em voga nas suas paragens, acredite: mais cedo ou mais tarde estarão. Portanto, é bom ficar esperto.
Embora eu tenha escrito este artigo pensando nos responsáveis por um projeto de GC e/ou de Portal Corporativo, estou certo de que ele serve para qualquer pessoa que queira mergulhar um pouco mais fundo nessa história toda.
Assim, meu objetivo aqui não é produzir uma tese de doutorado, nem enumerar cases de sucesso. Mas sim, a partir da reflexão teórica e da minha vivência prática, tentar sintetizar uma visão particular acerca do que é realmente importante compreender quando se decide encarar o desafio de casar portais com GC. Vamos nessa?
1. Atividade–meio. Se não entendemos, logo de cara, que GC não é um fim em si mesmo, tudo fica mais complicado. Ela só ganhou status porque o ambiente de negócios mudou – está mais competitivo, globalizado, uniformizado. Logo, a GC (e o portal corporativo do conhecimento, por conseguinte) deve estar a favor da estratégia maior da empresa, assumindo seu papel decisivo de torná-la cada vez mais “inteligente” e, por conseguinte, inovadora, produtiva e competitiva. O portal corporativo vai pelo mesmo caminho: ele tangibiliza a gestão do conhecimento, estruturando o ambiente digital e atuando como elemento integrado (integrando informações e sistemas) e integrador (aproximando pessoas pela via da colaboração). Mas GC não se resume ao portal corporativo, é bom que se diga.
2. Tudo para todos = nada para ninguém. “Com a gestão do conhecimento, agora todos poderão ter acesso a tudo, via portal corporativo, contribuindo para tornar nossa empresa mais ágil e eficiente” – certo? Errado. Vivemos num mundo em que prevalece a overdose da informação. O problema não é a falta, mas sim o excesso. Logo, estimular o “tudo para todos” só vai aumentar a dor de cabeça. Basta pensar numa intranet com uma home padrão, em que cada vez mais conteúdos são depositados, dia após dia, sem critério e sem categorização. Um dos elementos para superar isso é pensar em termos de fluxos de informação – detalhes no próximo tópico…
3. Direcionar é preciso. A informação certa, na hora certa, para a pessoa certa – já ouviu isso antes? Trata-se do famoso “just in time” da informação, termo que importamos da logística. Portanto, para tirar o máximo proveito de programas de gestão do conhecimento (e para fazer um portal corporativo funcionar de verdade), é preciso pensar em fazer antes uma boa gestão da informação, arando o terreno e deixando-o fértil para que a GC aconteça. Mas agora, diga-me: como saber qual é a informação certa? Como definir a hora certa? E a pessoa certa, quem é?
4. Mapear também é preciso. Só há uma maneira de responder as perguntas anteriores: mapeando. Processos, pessoas e conteúdos podem ser mapeados – isoladamente e uns em relação aos outros. E, em todos os três casos, a taxonomia joga um papel fundamental – ela é que dá a liga, gerando “etiquetas digitais”. Quer saber mais? Então me acompanhe.
5. Etiquetando todo mundo. Toda organização é um micro-cosmo – tem cultura, ritos, lógicas, modelos e estruturas próprios. Quando, no mapeamento de conteúdos, aplicam-se os bons e velhos conceitos da Biblioteconomia (prima mais velha da Ciência da Informação), eis que emerge uma dessas estruturas fundamentais – a árvore taxonômica. Estamos falando de uma hierarquia lógica de termos, em torno da qual uma organização estrutura sua vida. Complicado? Não: pense nas pastinhas (e sub-pastas) que você criou no seu computador para definir onde guardar seus arquivos e saberá do que estou falando.
Esses termos, que são definidos durante o trabalho de taxonomia, podem ser vistos como “etiquetas digitais”. E, se o trabalho foi bem feito, permitirá etiquetar tudo – pessoas, processos e conteúdos. Complicou de novo? Então vamos pensar em um exemplo bem simples: em uma hipotética empresa mineradora, seria possível presumir que “minério de ferro” seria um dos termos que a taxonomia elegeria como parte da árvore hierárquica. Estaria criada a etiqueta “minério de ferro”, que poderia ser “colada” em todas as pessoas que trabalham com este produto. E em todos os processos da empresa que o envolvem. E em todos os conteúdos que dizem respeito a ele. Tudo isso digitalmente, via portal corporativo. Notou o “pulo do gato”? Não notou? Quem sabe o próximo tópico ajuda.
6. Reuso. Guardar, guardar e guardar. É só nisso o que pensam as empresas que olham a gestão do conhecimento como “ferramenta para fazer o download do que está na cabeça dos empregados”. Elas acham que conhecimento é um objeto – mas ele é um processo vivo e dinâmico. Portanto, estão equivocadas. Criam “bases de conhecimento” gigantescas nos seus portais corporativos e pensam que estão ganhando algum diferencial com isso.
Mas o grande “pulo do gato”, citado anteriormente, não está em guardar, mas sim em reutilizar. Promover o uso e o reuso devem ser preocupações centrais, portanto. É por isso que a taxonomia e suas “etiquetas digitais” são tão importantes.
Elas permitem não só que agrupemos conteúdos similares, mas também que levemos pessoas a conteúdos (por meio de buscas mais estruturadas e de uma arquitetura da informação que de fato represente a forma como as pessoas hierarquizam os temas).
E permite também que levemos conteúdos a pessoas (se trabalho com minério de ferro e um novo relatório sobre ele é colocado no portal, o próprio sistema pode me enviar um alerta a respeito). Mais ainda: permite aproximar pessoas de pessoas (numa comunidade de prática dos que trabalham com minério de ferro) e estas de conteúdos (disponibilizando tudo já escrito a este respeito para a comunidade, por exemplo).
Com os mapeamentos e a taxonomia passamos a ter as rédeas do fluxo informacional na mão – e podemos então criar ambientes os mais diversos, nos aproveitando da flexibilidade do meio digital, para promover a gestão do conhecimento – e promover a real produtividade da nossa empresa no novo ambiente de negócios. Do ponto de vista técnico, tudo em ordem, portanto. Mas e do ponto de vista sócio? Complicou de novo?
7. Reconhecimento. Quem registra e guarda? Quem categoriza? Quem, principalmente, reutiliza, para gerar novo conhecimento? As pessoas. Portais Corporativos do Conhecimento são elementos que dependem de uma abordagem sócio-técnica para atingirem sua plenitude. As pessoas são o lado sócio. E tudo que falamos nos itens anteriores diz mais respeito ao lado técnico. Mas que “pessoas” são essas?
O saudoso Peter Drucker cunhou o termo “trabalhador do conhecimento”, em contraposição ao operário (personagem surgido com a era industrial) e ao trabalhador rural (figura central da era agrícola). É dele que estamos falando. Aliás, é de você, que tem a informação como principal ferramenta e insumo no seu trabalho. E a utiliza, em diversos contextos, para gerar mais informação, tomar decisão e, com isso, gerar conhecimento.
Assim como o operário é bem diferente do homem do campo, o trabalhador do conhecimento tem características peculiares. Uma delas é que o reconhecimento do nosso talento ganha uma importância proporcionalmente maior do que antes. Acostumados ao mundo hiperlinkado, já sabemos que o verdadeiro poder da informação e conhecimento surge quando eles são colocados em movimento. E sabemos que ninguém mais possui, sozinho, respostas satisfatórias para os desafios de um mundo cada vez mais complexo.
Reconhecer o talento e, no caso dos portais, criar formas de reconhecimento também no meio digital (como os “karmas” que muitos fóruns na internet já utilizam) são elementos fundamentais para fazer com que as pessoas sintam-se envolvidas pela estrutura técnica criada.
Mais ainda: permitir que a autoria, o grau e a qualidade da participação das pessoas fiquem explícitos para seus pares é mostrar o grande valor de um ambiente digital integrado e integrador: o portal corporativo do conhecimento. Vale ressaltar que o mapeamento das pessoas, estruturando “páginas amarelas” e sistemas de buscas de especialistas, corroboram a idéia de que não somos apenas um número na multidão ou uma peça na engrenagem. Promovem o encontro e estimulam a troca, o uso e o reuso.
Portanto, poder crescer e aparecer é o grande benefício para cada trabalhador do conhecimento neste contexto – a grande peça de motivação intrínseca que vai fazê-lo vestir a camisa. Mas não é a única.
8. Gestão de mudanças. O exemplo que demos acima, em que o reconhecimento, via Karma, surge como importante elemento de motivação, deve fazer parte de um processo ainda maior – o de gestão da mudança. Isso significa basicamente que o ambiente digital deve ser inserido na vida global da corporação, sendo também necessário que as ações de reconhecimento sejam parte de mudanças mais profundas no próprio ambiente organizacional, guardando coerência entre eles.
9. Administração de empresas no século XXI. E o círculo se fecha. Começamos falando que um portal corporativo criado sob o viés da gestão do conhecimento (o portal corporativo do conhecimento) é elemento de uma atividade-meio. Mas engana-se quem pensa que isso diminui sua importância – pelo contrário. No novo século, todas as empresas (em especial as grandes) encontram-se diante de desafios que só podem ser enfrentados tendo como alicerce um ambiente informacional estruturado, com fluxos bem definidos. Aproximar os talentos e promover as condições para que possam conhecer e reconhecer seus pares é imprescindível, já que somente as pessoas podem tirar proveito da informação para gerar conhecimento. E é isso que um portal corporativo do conhecimento bem construído faz, inserido em um programa maior, de gestão do conhecimento.
Em curto espaço de tempo o portal corporativo do conhecimento será um sistema de “missão crítica” – aquele sem o qual uma empresa simplesmente não consegue ser competitiva, não consegue sobreviver.
Ainda que toda e qualquer empresa possa se beneficiar dele, é evidente que quanto mais “intensiva em conhecimento” ela for, mais importante o portal será – não por acaso, a pesquisa IMP Brasil 2005 constatou que os portais mais avançados encontram-se nas grandes empresas (onde a quantidade de informação é maior) do setor de serviços (que vive da venda do seu know-how, leia-se, do seu conhecimento) da região sudeste (via de regra, a mais avançada do país, que provavelmente reúne o maior número de empresas inseridas na competição em escala global, onde reutilizar a informação de forma estratégica, aproximar os talentos dispersos geograficamente e promover a inovação são fatores críticos).
Estamos falando, portanto, de algo que vai ganhar cada vez mais importância, porque está diretamente relacionado com a capacidade das empresas administrarem as demandas do século XXI. Fique ligado para não perder o bonde da história. E mais: incentive este debate na sua organização – você pode ser o elemento de vanguarda que vai abrir as portas deste novo contexto, conquistando um diferencial profissional e promovendo o avanço competitivo da sua corporação.
Portanto, se você entrar em sintonia com estas mudanças, compreendendo suas raízes, sua dinâmica e seus prováveis destinos, aumentam suas chances de aproveitar as oportunidades que surgirão. O mesmo vale para as empresas: quem sair na frente, estará melhor preparado.
Quem sabe este avanço inexorável traz uma nova perspectiva para seu trabalho e sua vida, assim como está fazendo com a vida das empresas? ;o) [Webinsider]