"Outsourcing: onde está o equilíbrio entre eficiência e rendição?"
Debate realizado no dia 28 de agosto, no INFO CIO Meeting, em Summerville
Sandra Carvalho, diretora de redação da INFO:
Esse espaço foi reservado para vocês, CIOs, falarem com os CIOs. E a discussão que nós estamos propondo hoje é sobre outsourcing, à luz do debate que existe atualmente sobre o papel da tecnologia em termos de alavancar inovações e criar vantagens competitivas. Outsourcing hoje é mais ou menos como globalização. Não interessa se você gosta ou não gosta, está acontecendo.
E quando se fala em outsourcing, milhões de perguntas ocorrem: outsourcing é inevitável? Outsourcing é obrigatório em infra-estrutura, onde costuma dar resultados acaçapantes em termos de cortes de custos? Outsourcing deve englobar também a área de software? Quando você engloba, não está, de alguma forma, abrindo mão da sua capacidade de criar um diferencial? Quando você adota as tecnologias terceirizadas que todo mundo está adotando, você, se pretende liderar, ou se lidera, não está abrindo mão de uma ferramenta importante para continuar à frente ou chegar à frente? Quando se parte para uma opção radical de outsourcing e se entrega a TI de uma empresa inteira, você não fica na mão do cara, com o melhor SLA do mundo? Você não fica na situação de cliente cativo?
Então são essas questões e muitas outras que eu não citei que se levantam quando se discute outsourcing hoje em dia. Para enfrentar essas questões cabeludas, complicadas e muito delicadas, nós chamamos pessoas muito especiais. O Karman, do Banco Real/ABN, o Mauricio, do Banco Santos; o Tadeusz, da Parmalat; o Carlos, da Shell, e o Flávio, do Submarino. A idéia é que eles contem a experiência deles e digam o que acham a respeito, num prazo entre cinco e dez minutos, e depois a gente abra a discussão para a platéia. Há casos interessantíssimos de outsourcing entre vocês. Quem vai coordenar a mesa redonda é a Débora, da INFO.
Débora Fortes:
Queria agradecer a participação de vocês. Karman, você pode começar?
Carlos Eduardo Correa da Fonseca, do Banco Real/ ABN Amro:
Boa tarde a todos. Me deram aqui o desafio de, em cinco minutos, falar sobre outsourcing. Eu vou jogar a bola para o alto e depois a gente bate papo sobre o que for necessário. Outsourcing de aplicações específicas, de áreas que são commodities da empresa e de alguns sistemas especializados são águas passadas. São coisas que a gente tem de fazer, que estão acontecendo, são alguns outsourcings que, por exemplo, nós fizemos este ano, com processamento de cartões, rede de telecomunicações e fábrica de software. São coisas tranqüilas. Agora o maior impacto disso acho que é decorrente de um artigo recente que deu em rádio e TV, que é “IT Doesn’t Matter”. Esse artigo tem sido muito debatido por publicações especializadas. Na das últimas Business Week, o assunto foi matéria de capa e é uma coisa bastante crítica.
Será que, de fato, tecnologia não faz mais uma diferença? Nesse artigo, um professor de Harvard compara o desenvolvimento de IT com algumas commodities importantes, como energia elétrica, motores elétricos, máquina a vapor, com coisas físicas. Na minha opinião, esse esquema é muito discutível, porque tecnologia na área de IT de uma empresa é muito mais do que hardware, é muito mais do que uma coisa física. No fundo, é a própria cultura da organização. E aí nós chegamos a um outro problema: até que ponto IT é ou não é estratégico para uma empresa? Até que ponto essas empresas podem abrir mão desses sistemas core dela, desses sistemas estratégicos de TI?
Aí, existem dois pontos-chave. Um é o alinhamento estratégico das áreas de negócio. No momento em que o IT se isola – e está totalmente isolado e nada mais é do que uma área da empresa que recebe pedidos de uma área de negócios e transporta isso para dentro do computador – ela está criando um isolamento que pode ser terceirizado. Ela não está vivendo a empresa, não está trabalhando junto com as áreas de negócios para ajudar a empresa a ganhar mais dinheiro. Nesse isolamento, nós vamos acabar levando uma área de tecnologia para um total outsourcing.
E outro ponto muito importante é a complexidade que hoje existe numa área de IT. Durante esses anos todos, foram máquinas diferentes, sistemas operacionais diferentes, bancos de dados diferentes, os mais diversos aplicativos possíveis, um não falando com o outro. Ficou um ambiente tremendamente complexo. E os CEOs das empresas começam a ficar desesperados, porque uma coisa não falando com a outra, as respostas que a a área de tecnologia dá não são às vezes satisfatórias, em determinado momento qual o melhor jeito? Bom, passa logo isso para alguém que entenda.
E hoje é o lugar comum dos grandes fornecedores, dos grandes IT vendors oferecerem essa terceirização. Outsourcing é o business deles. Dentro de uma estratégia de controlar muito mais os seus clientes, de ter condição de fazer um fornecimento mais garantido, não precisa ter uma venda todo mês, enfim, é muito mais tranqüilo ter um outsourcing. Então, na hora em que chega uma companhia grande, um IT vendor poderoso para um CIO de uma empresa e diz: “Seu core business é banco, nós entendemos de tecnologia, nós somos a maior empresa do mundo e podemos fazer o serviço que você quer”, se não mantivermos uma área de tecnologia muito forte e gente que de fato conheça, a solução mais simples, para esse CIO, vai ser a terceirizar, porque eles estão cansados. E aí a gente tem que ser um pouco radical com vocês, eles estão cansados com uma certa incompetência da área de tecnologia. E acho que muitas vezes a área de tecnologia não conversa tanto porque também nós, dentro da área de tecnologia, estamos meio perdidos.
Então nós precisaremos ter uma arquitetura de sistemas muito bem definida, ter uma posição muito forte dentro da empresa para ter condições de tentar manter uma independência com relação a todas essas pressões externas que existem, que hoje são os grandes IT vendors e as maiores companhias de consultoria que estão vendo que, depois da bolha da internet, esse é o grande segmento de mercado. Então é o desafio que fica conosco: vai se terceirizar ou não, dependendo da nossa competência de oferecer serviços bons para a companhia e ajudar as empresas a ganhar dinheiro e trabalhar junto com as áreas de negócio da empresa para conseguirmos fazer com que ela cresça cada vez mais.
Maurício Ghetler, do Banco Santos:
Em primeiro lugar, essa história de “IT Doesn’t Matter” eu acho que é uma tremenda de uma afirmação errada. Me parece que vem de um CIO ou de um chairman descontente. Infelizmente, existem situações nas quais o desespero, como colocou o Karman, sobre os maus resultados da área de IT, o descomprometimento com a área de negócios fazem que haja essa impressão. Acredito que, em algumas áreas perfeitamente “outsourciáveis”, “IT Doesn’t Matter”, mas não podemos imaginar dessa forma, principalmente no segmento financeiro.
Pelo menos no banco que eu represento, IT é uma área importante, que tenta fazer o banco produzir alguma diferença no mercado, criar produtos novos, se envolver no negócio. Acho que à medida que nos envolvemos no negócio, uma boa parte de IT tem grande importância. Eu não vou aqui tirar o mérito de alguns players do mercado pequenos e grandes e médios, por exemplo da LocaWeb, que tem feito um trabalho muito bacana, particularmente o LocaVoz, muito bacana o serviço; o caso da PrimeSys, fantástico na parte de telecomunicações. São serviços que vão acontecer e não adianta a gente tentar ser melhor que eles. Eles são bons, é um fato que temos que aceitar, entender e tirar o melhor proveito disso.
Agora, existe uma parcela do negócio que nós conhecemos e que essas empresas não conhecem. Essa parcela é que faz a diferença do nosso negócio. Acredito que essa parcela sobrevive sempre, é a inteligência do nosso negócio e é nessa parcela que a área de IT tem de se concentrar. É aí que reside o nosso trabalho daqui para a frente, ou seja, “outsourciar” o que é possível, aquilo que não compensa brigar, que a commodity é boa, e aquilo que somos melhor que a commodity fazemos nós.
Tadeusz Prusaczyk, da Parmalat:
Boa tarde a todos. Acho que o nosso caso é um pouco específico, pois tem de se entender o momento da empresa. A Parmalat é uma empresa que cresceu no Brasil através de aquisições. Ela tem diversas marcas, hoje são nove diferentes, culturas diferentes. E ela não tem dentro de casa uma cultura de outsourcing. Dentro desse plano maior de reestruturar e reorganizar a operação no Brasil, foi elaborado um plano até bastante ambicioso na área de TI, para que viabilizasse e acompanhasse todo esse projeto de reestruturação.
À luz desses grandes objetivos, elaboramos um plano estratégico na área de TI, que contempla mais ou menos dois ou três anos, e basicamente tem as seguintes premissas: hoje, na Parmalat, a área de TI tem como principal função suportar o core business da empresa. Ou seja, a área de sistemas tem como função principal reorganizar a companhia e permitir que ela possa crescer de forma lucrativa. Dentro desse plano, estamos contemplando vários projetos de outsourcing.
Posso citar aqueles que já foram realizados com sucesso: a terceirização de toda a nossa rede de dados, que inclusive foi feita com a Primesys, a parte de infra-estrutura e suporte de operação das fábricas e dos centros de distribuição do Brasil todo foi entregue para uma outra empresa e também a área de suporte de sistemas legados. O que não temos intenção de terceirizar nesse momento é a parte de implementação de sistemas core, que é o nosso ERP, a parte comercial, a parte de e-business, que é um projeto mundial da Parmalat. Dentro de uma equipe de 130 pessoas na área de TI, temos aproximadamente 50% das atividades terceirizadas.
Carlos Roberto Teixeira Netto, da Shell:
Vou tentar dar uma perspectiva bastante rápida, viva e real do outsourcing na Shell, estamos cobrindo um período de cerca de 17 anos. Mas por que tanto tempo atrás? Nesse período, muita coisa mudou, mas algumas permanecem e muito atuais. Em 1984, a Shell teve de fechar o resultado para os acionistas de forma precária. Foi um estresse muito grande para os executivos e TI era parte responsável pelo insucesso dessa situação. Ficou claro para os executivos da companhia que nós não tínhamos condições de gerenciar tecnologia. Foi um reconhecimento honesto de não ter capacidade para gerenciar a tecnologia. Então foi, nesse aspecto, uma certa rendição. Se não sabemos fazer, vamos entregar para alguém e resolver nosso problema. Gente, nunca façam isso! Porque não é assim que se trata as coisas. Mas hoje, depois de 17 anos, é fácil falar. Naquela época houve honestidade, mas não se transfere problema dessa forma.
Acredito que a Shell embarcou de forma pioneira no Brasil no outsourcing total, lá pelos idos de 1986 e 1987. O que foi a tecnologia da informação na Shell Brasil? Era um contrato desse tamanho, tentando cobrir todo o serviço e uma pessoa dentro da Shell que tentava buscar elementos para suportar sua discussão com o fornecedor. Foram cinco anos de sofrimento e quem viveu sabe o que foi isso. Ambas as partes sofreram, tanto nós empresa, quanto nosso provedor. Não se sabia como fazer isso bem feito, mas aprendeu-se muito.
Nós fizemos também uma coisa inédita: uma mudança de fornecedor depois de sete anos. Nós entregamos toda nossa tecnologia para um terceiro e depois vimos que não estava funcionando e resolvemos mudar. Nesse segundo momento, tivemos de repensar o que é fazer outsourcing. Resolvemos não passar tudo. Tomamos de volta para a companhia o que julgamos ser essencial, o conhecimento do negócio. Ficamos, de fato, muito na mão do fornecedor e resolvemos tomar de volta esse conhecimento. E tomamos. Fizemos outsourcing basicamente do que era commodity.
Isso realmente pode ser feito facilmente e eu tenho alguém dentro da companhia para controlar o nível de serviço, há pelo menos dez anos a gente faz isso. Esse foi o segundo momento.
Ainda assim, há cerca de cinco anos, quando cheguei à companhia, o relacionamento estava péssimo. De novo, essa história eu já conheço. O que a gente vai tentar de novo? Não posso voltar atrás, fazer um outsourcing total, como o meu fornecedor queria: "deixa tudo comigo que eu faço". Eu já conheço essa história. Mas também conhecia o "deixa eu fazer tudo que eu faço melhor". Então eu me concentrei, junto com os companheiros de trabalho, no relacionamento com o fornecedor. Como o pessoal da LocaWeb falou: "não adianta ter um SLA, se o SLA não é cumprido". Eu tenho que fazer junto com o meu fornecedor cumprir. De novo, é muito fácil transferir o problema, mas se o barco afunda, não adianta ver onde está o buraco. Essa parceria foi feita de fato. E depois desses 17 anos, a gente olha hoje para trás e tem uma constatação mundial, no grupo Shell, nós logramos ser benchmark em custo, superar todos os níveis de serviços e temos uma coisa que é meio contraditória com o custo baixo que é a satisfação do cliente. Temos um nível de satisfação do cliente que eu raramente vejo que me surpreende muitas vezes. Isso fica patente, a gente está no “quadrado mágico” do grupo Shell e estamos falando de 140 companhias no mundo. Esse processo de outsourcing funcionou.
Não paramos por aí, esse é o quarto momento. Estamos passando pelo outsourcing globalizado, mas se vocês me perguntarem o que é isso eu não vou saber responder ainda. Eu estou entrando nele. É um bicho estranho que vem por aí. A gente fez muito bem, mas não adianta ter fornecedores locais que vão me ajudar. Agora as coisas vêm da matriz, alguns contratos são globalizados. Qual o meu problema hoje? Como a gente tem uma eficiência muito grande e se você imagina uma curva de custo, se a gente está com um custo menor, quando faz a globalização, a média vai diminuir, mas o nosso custo vai subir. Isso é um fato. Até aceitar isso não é fácil. Nosso custo vai subir. Todo esforço feito vai meio que se perder. Então é uma situação difícil, dura e penosa.
Flávio Jansen, do Submarino:
Vou tentar passar a minha experiência, que é diferente do restante da mesa. A primeira razão é que no Submarino nunca chegamos a fazer um outsourcing de uma coisa que estava internalizado. Tenho a experiência de internalizar algo que eu comecei fazendo outsourcing. O primeiro ponto foi a commodity. Na verdade, o que eu busco é custo menor e nem sempre eu consigo custo menor fazendo outsourcing de commodity. Lá a pressão é de custo, em varejo a pressão é de custo. A primeira pergunta é: "vai reduzir o custo?", senão, tenho de fazer dentro de casa. O que eu chamaria de commodity é o data center, não temos um próprio. Tentamos fazer alguma coisa da operação ser terceirizada, mas é pouca coisa. Ali a gente busca custo mesmo e se não tiver custo faz interno e vou ter a dor de cabeça de fazer interno.
O segundo ponto que é interessante no outsourcing é que às vezes a questão é estratégica para a empresa. Vou dar um exemplo. Segurança é uma questão estratégica para o Submarino. Deveria ser um diferencial competitivo, mas ali eu faço outsourcing. Tenho uma empresa que faz para mim boa parte dos processos de segurança, porque eu tenho consciência de que não tenho know-how para estar atualizado. Não vou conseguir ter uma equipe que me traga o nível de especialização que eu preciso. Então, neste caso, optamos por fazer o outsourcing. Podia ter uma vantagem competitiva se eu fizesse em casa, mas o que vai acontecer na prática é a desvantagem competitiva, porque eu não vou ser nunca muito eficiente. Pode ser uma área crítica, onde se pode buscar ter vantagem, mas na realidade não vou conseguir isso. É uma situação que acontece com muitas empresas.
Às vezes, achamos que a aplicação é crítica no negócio, o conhecimento tem que estar dentro de casa, mas pode acontecer de o conhecimento que está dentro de casa nunca ser melhor do que o que está disponível no mercado. Daí tenho de admitir que sei menos que o mercado, não sou inovador, então por que vou querer ter essa barreira? A solução é buscar quem está fazendo melhor que você. Já que você não vai conseguir criar vantagem competitiva ali, tente evitar ter uma desvantagem.
Existem áreas que a gente se acha inovador, como o comércio eletrônico, então estamos optando por não fazer outsourcing ou usar terceiros para ajudar no desenvolvimento do produto, mas internalizando o conhecimento e não deixando ele replicar aquilo para outra empresa. Desenvolvemos um sistema de fraude, que optamos por internalizar e não deixar aquilo ser utilizado por outros. Na parte que acho que o Quiroga da Americanas também considera crítica para ele, que é a parte de conhecimento do cliente, mining, e-mail marketing a gente busca fazer dentro de casa. Podemos usar terceiros, mas não vamos fazer o outsourcing daquilo. Acredito que temos capacidade de sermos inovadores e termos vantagem competitiva com isso.
Fizemos outsourcing que funcionou bem em alguns serviços, tipo prateleira, chat, o e-Bit que faz uma avaliação da loja pra gente. Sabemos fazer isso, mas o outro faz tão direitinho e por que eu vou internalizar aquilo? Posso até ter um custo maior fora, mas realmente você fica achando que não vai ter aquela qualidade de serviço.
Tenho exemplos que eu internalizei. Como tinha de ter velocidade em alguns projetos, comecei com o outsourcing, por exemplo, no desenvolvimento do site. Saí fazendo com terceiros desde o início, porque tinha que ser rápido, a gente não ia ter capacidade de montar a estrutura internamente. Depois optamos por internalizar, um caminho inverso daqui da mesa redonda. Uma das razões é sempre custo, a outra é que em algumas situações você não consegue separar tanto, isolar. A opção por internalizar agilizava o desenvolvimento de novas funcionalidades, de features, dava agilidade à área de TI para atender os negócios.
Débora:
Agora vamos abrir a sessão de perguntas.
Enio Salu, do Sírio Libanês:
Partindo para a linha de que se pode separar o core do resto e considerando o resto commodity, o que acham do próprio usuário final comprar as commodities, sem participação da TI?
Flávio:
A pergunta é eliminar a TI na hora de comprar commodity? Isso eventualmente acontece. Existem empresas que têm estrutura de unidade de negócios e que adotam esse modelo. O usuário tem a opção de comprar, de ser o contratante dos serviços.
Pessoalmente, acho que isso é sempre um risco, porque é muito difícil manter aquilo organizado. Mas é uma realidade para a qual a pessoa de TI tem de estar preparada. Se a organização que tem a estrutura de permitir à unidade de negócios adquirir todos os serviços, o papel do CIO nesse momento é estar preparado para lidar com tudo isso e tentar ao máximo evitar que se crie uma bagunça. Mas a opção nunca é do CIO, é a maneira que a empresa escolhe para organizar sua estrutura como um todo.
Carlos:
Não pretendo dizer que esse é um modelo, mas o fato é que nós fizemos essa pergunta nos cinco últimos anos, em que nós gerenciamos o IT de forma coletiva, ou seja, eu era quase que o “síndico” do serviço. Fizemos um trabalho muito aberto e transparente alinhado ao negócio, porque TI está aí para isso mesmo, para suportar o negócio, não tem outra razão de ser. Numa dessas últimas reuniões que nós fizemos, tínhamos dez pessoas nesse grupo, havia um representante de cada negócio ou área de serviço e eu resolvi fazer essa pergunta: "entre os modelos que experimentamos na companhia nos últimos vinte anos (de ter o pessoal totalmente de TI dentro da Shell, totalmente fora e depois 50% dentro e a outra metade fora), qual vocês preferem? Foi unânime: este, Teixeira, mantém. Então foi um modelo balizado pela comunidade de usuários e nesse caso foi o modelo que eu mantive. Alguém poderia questionar: “eu posso contratar mais barato, eu posso contratar melhor”, mas não tinha ninguém que pudesse falar isso. Se tivesse, ia ser complicado.
Maurício:
Numa corporação, cada usuário, se puder contratar separado, vai contratar o que bem entende e não vai haver uma padronização. Posso garantir que existe aquele efeito bumerangue, em que você joga e depois volta na sua cabeça. Ou seja, a área de TI depois é chamada para tentar juntar esse monte de processos, esse monte de estruturas, infras, e tudo o que foi comprado ao gosto do freguês. Se não somos competentes para definir uma linha de produtos, de serviços e de infra-estrutura para nossa companhia, nós é que estamos errados, está na hora de trocar o CIO dessa companhia. Porque ele não consegue administrar a área de tecnologia, ele não consegue dar uma orientação ao usuário sobre qual o melhor caminho.
Karman:
Acho que existem dois pontos fundamentais para o CIO hoje. Primeiro, esse alinhamento estratégico das áreas de negócio. O segundo é definir uma arquitetura padrão para a empresa. Estou chegando ao ponto de dizer o seguinte: não importa qual seja a arquitetura, desde que ela seja estável. O que nós não podemos é ficar mudando a cada instante, mudar a cada instante, introduzo uma variedade, uma complexidade na instalação, que fica praticamente impossível manter isso. Então, desde que tenha standards muito fortes, o problema de compra é quem consegue comprar melhor, é meio relativo.
Nós precisamos seguir esses standards, eu acho que esse é um ponto mais crítico numa gestão de uma área de tecnologia hoje e é muito difícil fazer isso com a vaidade toda que existe, é muito difícil fazer isso pela pressão dos IT vendors. O pessoal não vende mais IT, não vende mais para o usuário final, vende para o “senhor da empresa”, se não consegue vender no Brasil vende no exterior. É difícil gerenciar isso e tentar manter a integridade numa instalação, tanto que algumas vezes é meio desesperador. Eu com os meus cabelinhos brancos, ainda tenho um pouco de braço para tentar administrar esse processo, mas o pessoal novo na área, que não tem uma visão integrada de todo esse processo, passa maus bocados. Tenho visto as novas gerações que chegam na área de tecnologia, para segurar essa pressão que vem das áreas usuárias, que vem de fora, é muito, muito difícil.
Eric Gorescu, da PrimeSys
Queria colocar para a mesa de que tudo na vida pode ser bem feito ou mal feito, inclusive outsourcing. Independentemente do nível de complexidade e do nível de problemas que o CIO está tendo para tomar conta do seu IT, o outsourcing nunca, em momento algum, transfere a responsabilidade do problema para o vendor. Ou seja, a responsabilidade fica na companhia, o resultado vai ser do CIO, independentemente de quem está fazendo o consórcio. Se ele tem na cabeça dele a idéia de que vai pegar um pedaço qualquer da companhia e vai passar totalmente o problema e a responsabilidade para o vendor, como será que ele trata os resultados da empresa? Será que esse cara efetivamente está tratando a empresa de uma forma correta, está tendo a melhor visão para a empresa, ou seja, está alinhando as necessidades dos acionistas às necessidades internas que a empresa tem?
Maurício:
Acredito que em todas empresas existem atividades que podem ser “outsourciadas”. Chega um determinado momento em que você terceiriza tudo. O que acaba acontecendo é que alguém faz melhor do que você parte disso e vira uma companhia. A Dell é um exemplo disso. Ela é uma montadora, ou seja, ela só monta, monta melhor, tem um modelo de negócio, comercializa e ganha mais dinheiro que os outros. Ela deu uma volta por cima em grandes fabricantes tradicionais por conta de terceirizar tudo e ter um modelo diferente dos outros. Acredito que, da mesma forma, pode acontecer o contrário, de se chegar a uma situação de terceirizar e perder o controle, de não ser uma boa idéia.
É preciso saber identificar exatamente o que é possível, o que faz sentido “outsourciar” e não simplesmente cair num modelo de outsourcing total. Não acredito naquelas soluções que prometem resolver qualquer problema. Como você consegue se não conhece meu problema? Essa é a primeira pergunta que devemos fazer. Muitas vezes a gente vê soluções mágicas, muito bem “marketadas”, que vem direto pelo CEO. Elas consideram que uma empresa é igual a outra empresa, que tem os mesmos problemas. Um banco não é igual a outro, nós não somos iguais. Gostaria até de ser mais próximo. Então o meu business é totalmente diferente. Para a empresa que faz outsourcing isso aparece muito. Ela diz que resolve e acredito que no final das contas o resultado não é positivo. Acho que essa visão total, que às vezes passa pela cabeça de um CEO, não é uma visão correta.
Karman:
O CIO nunca poderia fugir da responsabilidade, terceirizando ou não terceirizando. O pessoal passa a responsabilidade para fora. Num determinado momento falta coragem, falta conhecimento, às vezes, está muito difícil entender todo o environment e um discurso desses tem apelo. É complicado, mas na área de tecnologia eu tenho sentido muito isso.
Agora eu vou inverter um pouco e jogar uma questão para o auditório. Vamos analisar alguns casos importantes de outsourcing. A Nike, por exemplo. Ela tem uma marca e um design, o resto é tudo outsourcing, a fabricação, a distribuição. É todo um modelo de negócio que funciona com outsourcing global. Deu certo, ganharam um monte de dinheiro, tomaram conta do mercado. Vamos pegar um outro caso que acho fantástico. O caso da IBM, quando fez um outsourcing do sistema operacional dos microcomputadores. Ela terceirizou o sistema operacional para um garoto que estava tentando vender o Basic para eles. Foi um sucesso. Nos primeiros anos, o PC tomou conta do mercado mundial. A Apple, que dominava aqui, desapareceu àquela altura. E o que aconteceu um pouquinho depois é que a Microsoft virou o maior concorrente da IBM. Bill Gates, o homem mais rico do mundo, numa operação de outsourcing. Foi um sucesso ou foi um insucesso? A Intel também, mas esse é um ponto pra gente pensar. É uma situação muito individual de cada empresa.
Michel Gora, da LocaWeb:
Meu pai, que era comerciante, dizia que “nada como ter a barriga no balcão”. O que eu quero dizer com isso é que dentro das empresas são os IT internos e os CIOs que vão definir e que sentem os seus problemas. O exemplo típico da IBM e da Microsoft mostra bem claramente isso. A IBM tinha um problema interno e, em vez de resolver internamente, porque ela que sabia o que tinha, foi buscar a solução fora. Acho que o problema todo está baseado nisso. O que está faltando é realmente existir, entre aqueles que nos pressionam de fora e os de dentro, o bom senso de saber o que eu preciso de verdade de fora e o que preciso de dentro. Nada mais simples que isso. O exemplo da Nike, que fez um negócio tão espetacular, faz a TI dela interna, que é o desenho do tênis. Ela não deixa ir para fora.
Maurício:
A IBM, naquela ocasião, não considerou o microcomputador como o seu core business. É uma coisa para se pensar.
Karman:
Acho que você levantou um ponto fundamental. A gente só pode terceirizar uma coisa que a gente conhece bem, que pelo menos sabemos gerenciar aquele processo. Um exemplo é o caso típico da nossa empresa. Num determinado instante, nós imaginamos terceirizar toda a montagem da rede de comunicação de dados. Naquela altura, as propostas que eu recebi eram absurdamente caras. Nós resolvemos desenvolver internamente a rede e montá-la. Infelizmente, eu não estava com a rede pronta no momento em que o Itaú e o Bradesco venderam as redes. Nossa rede estava sendo montada. Nós conseguimos montar essa rede alugando linhas e equipamento da Cisco por um quarto do preço das propostas que nós tínhamos. A rede pronta, operando, com o SLA definido, com o centro de comando montado, a gente sabendo exatamente o que nós queríamos, nós chamamos os fornecedores para terceirizá-la. Nessa altura, conseguimos 25% de economia em relação ao que a gente estava fazendo. Coisas que foram feitas com total controle gerencial do processo, entendendo o que a gente estava fazendo. Eu acho que dá certo. E também tem momentos e momentos, você tem de saber, para fazer da melhor forma possível.
Luis Augusto Valença de Oliveira, da Autoban:
Queria fugir dessa polêmica de terceirizar apenas de TI e expandir para as demais áreas de negócio da empresa, mais simples, como contabilidade, folha de pagamento, finanças, contas a pagar, essas coisas que fizeram surgir o ERP, também falamos de padronização e do poder das nossas áreas usuais. Eles têm poder para terceirizar os negócios deles. A empresa pode terceirizar a área folha de pagamentos, por exemplo, e o fornecedor escolher não necessariamente os mesmos ERPs que a gente utiliza e as mesmas tecnologias, metodologias e os padrões que nós temos. Não estou defendendo nem um modelo nem outro, queria apenas ouvir a opinião de vocês a respeito dessa questão. Terceirizando o processo, junto vai toda a necessidade de tecnologia, de sistemas, de banco de dados, de fornecer relatórios, informações e aí por adiante. Eles se tornam independentes dos problemas que eles têm com o negócio e também da tecnologia.
Carlos:
Na verdade, não há receita para isso. Quando nós implantamos o ERP, nós discutimos como é que iríamos fazer a parte de suporte e o bom senso disse que deveríamos manter dentro de casa pessoas que conheciam os processos, o negócio, e esse pessoal foi dando suporte ao negócio. Então a nossa área de ERP é muito pouco terceirizada, diferentemente das demais. Isso nos levou a ter um menor custo entre as companhias do grupo, comparando inclusive com a Ásia, por exemplo, que tem custo muito baixo. Em termos de eficiência, nós tivemos sucesso. Agora, podemos ter essa mesma eficiência terceirizando? Eu não vou responder. Porque esse é um caso de sucesso que funcionou. Vai funcionar em todos os casos? Não sei.
Existe uma coisa na terceirização que é fundamental. Ele é diferente se administrar o recurso interno da casa. Numa reavaliação que fizemos sobre se fazíamos ou não o outsourcing ou se mantínhamos o modelo ou não, ficou claro que existia um gap que nós tínhamos que enfrentar. O gerenciamento do outsourcing não é óbvio. Eu não vi muito conhecimento por aí. Então você consegue ter o insourcing funcionando, o outsourcing completo funcionando, você consegue ter essa mescla funcionando se souber fazer.
Flávio:
Acho que é um pouco verdade o que você falou quando a área terceiriza um serviço, ela dificilmente vai olhar as implicações em tecnologia. Você vai ser chamado um pouco à frente do processo para ver o que vai acontecer. E a outra coisa que acontece é mudar a experiência. Eu tenho, por exemplo, a folha de pagamento terceirizada. Tem algumas questões de tecnologia, mas como sempre foi terceirizada, já foram resolvidas no início. Mas eu tive uma experiência de internalizar a operação (no Submarino, a gente fazia terceirizada e teve de internalizar) e quando se internaliza você descobre que tem um gap de sistemas. Sistemas que o terceiro já usava e aí você não vai ter aquela licença, não vai poder utilizar internamente, não é compatível com o seu sistema. Então eu concordo que existe uma tendência na hora de terceirizar das pessoas acharem que é um problema mais simples do que ele é. Quando se terceiriza, tem que olhar todos os aspectos, inclusive se quiser trocar de vendor, se quiser colocar dentro de casa, se quiser fazer com outro.
A resposta para isso é que as pessoas olham às vezes para a terceirização como uma maneira de se livrar do problema, como a gente já conversou aqui. E outsourcing, na verdade, não é uma maneira de se livrar do problema, outsourcing é uma maneira de se resolver seu problema de forma mais eficiente, por custo ou por outras razões. A solução é saber que quando se está fazendo outsourcing não se está eliminando o problema, mas resolvendo de uma outra maneira e aí endereçar todas as questões, que passam por isso mesmo: interface, integração, mudança de venda, quebra de contrato e tudo isso tem de ser feito antes de negociar. Quando acontece uma dor de cabeça porque o outsourcing não funciona bem é porque a área que está fazendo o outsourcing não faz o dever de casa completo.
Maurício:
Complementando, eu tenho uma experiência engraçada sobre outsourcing de folha de pagamento, que aconteceu em 1983, numa ocasião na qual eu tirei um outsourcing de um birô de folha de pagamento para internalizar dentro da empresa. Passou-se o tempo e na década de 90 eu fiz exatamente o contrário. Eu tirei da empresa e coloquei no outsourcing. E mais recentemente, no ano passado, eu tirei de uma empresa de outsourcing e voltei para casa. E vocês devem estar pensando: "Maurício, você é maluco?" Eu não sou maluco, a questão é a seguinte: as coisas mudam e as empresas às vezes não evoluem.
Pessoas, empresas, processos que são “outsourciados” às vezes não evoluem na empresa que presta o serviço, então temos que retirar, pois elas não estão trabalhando a contento. O mercado mudou, evoluiu, mas elas não mudaram. Isso aconteceu com muitos birôs, por isso eles não estão processando dados hoje. Senão, seria o máximo, não é verdade? Há vinte anos, os birôs eram o maior modismo, mas não estão mais aí porque não se adaptaram. Hoje em dia, as empresas estão ressuscitando isso no outsourcing, de uma forma geral, mas ainda são birôs de processamento. São empresas que se dedicam ao processamento ou que se dedicam a prestar um serviço de telecomunicações, mas o fato é que esse serviço tem de ser monitorado. Essa questão com a Shell e essa questão engraçada que aconteceu comigo na folha de pagamento, ela acontece sempre e vai acontecer sempre. Ou seja, temos que estar sempre ativos para monitorar essa qualidade e no momento em que a qualidade não estiver suficientemente boa ou o serviço estiver caro ou eu tiver um problema de disponibilidade ou um problema diferencial de negócio que não é atingido com essa empresa de outsourcing, eu devo reverter a situação, isso é administrar.
Waldir Lopes Jr., da Eletrolux:
Maurício, na verdade a gente fica se perguntando qual seria o efeito de se terceirizar isso ou aquilo outro, mas há 25 anos tínhamos tudo 100% terceirizado e não havia esse pudor de que alguém ia ver que eu não estava processando. Ia cartão e voltava relatório, ia de Fusca, numas malinhas. O motorista via o relatório da folha, o movimento de vendas, tudo. Todo mundo sabia tudo. Às vezes, os birôs trocavam as malas. O birô dava a mala de um banco para outro. Então eu talvez discorde um pouco do Maurício com relação aos birôs. Eu não sei se o problema foi que eles não evoluíram e por isso eles desapareceram. Na verdade, houve um momento em que o mercado convenceu a gente de que deveríamos fazer tudo sozinhos, inclusive a contabilidade, contas a receber e a pagar. E hoje se começa a discutir isso como se fosse algo novo ou que fosse causar um efeito diferente na empresa. Mas a verdade é que começamos assim e só voltamos àquele mesmo ponto, com a diferença de que trocarmos relatórios e cartões por links de comunicação e internet. Essa é a única diferença.
Acho que as próprias empresas vão perceber qual o efeito certo da terceirização dentro disso que a gente chama de commodity e que também naquela época o grande problema era administrar o SLA. E naquela época, por incrível que pareça (hoje a gente fica falando de standarização, de sistemas compatíveis), todos nós usávamos o mesmo sistema. De vinte a trinta bancos utilizavam o mesmo sistema de conta corrente e as contabilidades, contas a pagar e contas a receber. A gente, depois de um determinado ponto, inventou várias rodas diferentes, quadradas, ovais, redondas, e agora talvez estamos chegando à conclusão de que “puxa, a roda deve ser redonda mesmo!”.
Maurício:
Gostaria de lembrar a quem é do meu tempo, do seu tempo, aqueles que têm ou não cabelos, que as coisas eram muito diferentes naquela época. A nossa necessidade de processamento de dados, de telecomunicações, era ridícula em comparação com os dias de hoje. Naquela época, eu não me lembro de nós fazermos GED, mandar um e-mail, de “browsear” na internet, de ter vírus e de muitas coisas. O fato é que naquela época as coisas eram muito triviais. Uma empresa, por exemplo, um banco, no máximo, fechava a sua contabilidade e estava tudo bem. Não precisava fazer nenhum internet banking, ter URA, nem um monte de coisas.
As coisas mudaram. A complexidade apareceu, a necessidade dos usuários mudou. Eles comeram mel, se lambuzaram e hoje em dia têm uma expectativa muito maior do que tinham naquela época. Nós não podemos continuar achando que aquele esquema de birô teria algum sentido hoje em dia, ou seja, se eles tivessem de fazer tudo isso que nós queremos a um preço bom, a uma qualidade boa e a uma disponibilidade boa, fique tranqüilo, eles estariam aí. Mas eles não assumiram isso. A diversidade de tecnologias que existe hoje foi uma forma tortuosa de se chegar aos dias de hoje. Eu concordo que hoje em dia precisaremos de uma roda redonda de novo, mas é outra roda, não é mais aquela, aquela era de madeira.
Laércio Albino Cezar, do Bradesco:
Como todos sabem o Bradesco foi o primeiro banco a terceirizar, por exemplo, a marcenaria, uma gráfica e por aí afora. Mas o que eu quero chamar a atenção é que prefiro tratar o tema como terceirização e não como outsourcing. Até porque terceirização parece uma coisa ligada à moda, que é passageira e muda de acordo com a sua necessidade, com o ambiente. Surgiu na seqüência da terceirização algo que se chamava quarteirização. Pouca gente fala nisso, e a quarteirização nasceu e morreu rapidamente. Quando se fala em terceirização de TI, também acho que há um equívoco com relação a isso. Não se terceiriza TI. Existe dentro de TI uma complexidade muito maior do que aquilo que a gente se refere a TI. Ela é muito abrangente, atende a muitos segmentos. Eu acho que a gente pode falar, quando o assunto é TI, o que se pode efetivamente terceirizar em TI e o que não se pode terceirizar. A gente pode perfeitamente terceirizar uma impressão decorrente de um processamento.
Quando se fala que se transportava documento no passado por carros pequenos, por motos, por mensageiros e por motoboys, hoje continua da mesma maneira. A gente terceiriza a impressão e essa impressão é feita fora e, portanto, continua sem a segurança necessária. Agora quando se fala em terceirizar um núcleo de TI, a inteligência do negócio, aí a coisa muda de figura. Mas na minha ótica, na ótica do Bradesco, muda por uma razão totalmente diferente daquilo que vem sendo discutido até agora. Muda porque quando você terceiriza ou pensa em terceirizar algo que evidentemente não pode retomar rapidamente, passa a correr um risco gigantesco.
Como uma grande empresa pode colocar nas mãos de terceiros algo que é o seu coração? Nós podemos viver sem um braço, sem uma perna, mas não podemos viver sem um coração. Então a terceirização que diz respeito a TI precisa ser bem separada. Existem coisas em TI que se terceiriza com total propriedade e sem nenhum tipo de problema. Por exemplo, o Bradesco terceirizou a comunicação, mas existem no mercado muitas empresas que praticam a comunicação com eficiência. Então se a atual empresa não estiver fazendo de acordo, eu posso mudar, sem nenhum trauma, agora como é que nós podemos trazer de volta um núcleo de computadores que processam as milhares de transações que fazemos diariamente? Isso é impossível. Quando nós temos que fazer uma migração de um sistema operacional, nós estudamos por muito tempo, fazemos num final de semana com toda cautela necessária. Quer dizer, nós corremos muitos riscos e se isto está fora, como pode retomar em caso de necessidade? Por exemplo, um acidente de percurso em que uma empresa que faz a terceirização fecha as suas portas. Acho que é preciso se estabelecer corretamente essa questão da terceirização. Terceirização, em TI, não existe. Existe terceirização de parte da TI. Como é moda, alguns de nossos CEOs escutam falar de terceirização e dos ganhos decorrentes. Cabe ao homem de TI dizer a ele que podemos terceirizar, mas se houver um problema, não há retorno. E, portanto, que a empresa pode sofrer conseqüências gravíssimas. Terceirizar em TI precisa ser feito, porém observadas as partes de TI, nunca a TI como um todo. Precisamos terceirizar aquilo que pode ser terceirizado em TI.
Karman:
É muito importante quando o Laércio colocou que tem parte de TI que não pode ser terceirizada, é aí que entra o que é estratégico e o que é core da empresa. O que eu quero dizer a vocês é que...
Laércio:
Realmente aquele artigo que você citou eu também li e achei totalmente impróprio. Não há o que comparar a TI, como foi colocado no artigo, com energia, água e coisas de gênero. Não é um bem dessa natureza, só que precisa separar da TI, a verdadeira TI. Porque quando se fala da tecnologia da informação como agregada ao negócio, mas como um todo. Tem um núcleo da TI, que é o coração da TI, que este deve, principalmente nas grandes corporações, ser de total domínio das empresas.
Karman:
O que eu concordo em grau, gênero e número. Agora, existem, e é isso que eu quero dizer a vocês, casos em que estão terceirizando tudo. O Banco JP Morgan, por exemplo, terceirizou tudo de tecnologia, inclusive essas partes que o Laércio colocou e que eu concordo com ele. Não podemos fazer isso. Mas existem esses casos e estão vendendo isso para os CEOs das empresas que é possível fazer isso e é por isso que eu chamo a atenção. Acho que isso é uma loucura.
Laércio:
Eu escutei há poucos dias, no Brasil, uma empresa de aviação que terceirizou o seu processamento e hoje tem dificuldade de controlar a venda de bilhetes. Está na mão do terceiro, quer dizer, seu coração está num outro lugar.
Nelson Reis, da Telefônica:
Queria fazer uma pergunta para a mesa baseada num estudo feito recentemente pelo Gartner sobre terceirização bem feita. O tempo do CIO e da equipe dele, quando consegue passar esse lado operacional para uma outra empresa, o time, mesmo reduzido, que fica, imaginando até uma transferência de recursos humanos, ele consegue ficar mais próximo das análises estratégicas. Até uma razão de CIO galgar às vezes outros postos na própria empresa. De uma certa forma, a Telefônica, com uma grande experiência no Brasil de outsourcing na área de WAN, já com projetos do Banco Itaú, do Banespa/Santander, do próprio Pão de Açúcar, percebeu que alguns desses executivos hoje estão com outra finalidade, uma responsabilidade muito maior. Quero lançar para mesa se realmente a locação do tempo da equipe foi realmente voltada para o lado estratégico. Outro ponto também é a questão de trocar o Capex por Opex, principalmente na área de tecnologia, onde há riscos de desatualização tecnológica.
Carlos:
Vou começar, de certa forma dando razão ao Laércio, ou seja, na parte de hardware, por exemplo, a Shell decidiu ter os equipamentos. Então nós temos a posse dos equipamentos que estão em nossas dependências e temos um terceiro operando-os. É um modelo, não é uma regra, receita, mas nós o operamos e crê que é boa. Estou permanentemente me questionando, nesses cinco anos quase que diariamente, é a melhor forma de fazer tudo (telecomunicação, parte de projetos, de manutenção)? O que nós temos é o melhor para nós, então isso não é receita para ninguém. Você perguntou sobre o tempo, eu me lembro que quando assumi o cargo na Shell Brasil, eu tomava grande parte do meu tempo com o meu fornecedor, porque não estava bem. Nos últimos dois, três anos, eu praticamente só cumprimentava o gerente de conta. Esso é um fato, mas você tem de gerir esse contrato de forma diferente. Eu tinha meu pessoal e cada um era praticamente o gerente responsável por cada contrato e isso era o dia-a-dia. Os contratos eram modificados quase que de forma contínua, sem nenhum estresse. Hoje em dia, eu não me preocupo com isso nem um pouco.
Flávio:
Hoje eu sou o diretor geral do Submarino e também acumulo, de certa maneira, o cargo de CIO. Acho que a resposta é que terceirizar não vai te livrar o tempo. Organizar, estabilizar, planejar é que vai dar o tempo para que a pessoa se envolver mais com a estratégia de negócio. Não acredito que se você terceirizou é por isso que passa a ter um tempo para a estratégia de negócio. E na equipe eventualmente algumas pessoas estarão habilitadas a fazer outras funções ou ampliar o escopo delas. Mas outras pessoas são muito mais técnicas. Eu não diria que a terceirização é uma maneira de você liberar seu tempo e as pessoas se tornarem mais alinhadas com o negócio. Acho que você tem que saber o melhor caso, a melhor gerência, saber que terceirização não é passar o problema adiante, mas uma outra maneira de resolvê-lo e buscar acreditar que seu tempo está dentro da sua realidade. Já no aspecto financeiro, eventualmente vale a pena. Há empresas que fazem isso. Os bancos hoje vendem seus ativos para se enquadrarem melhor. Vendem a agência, vendem a rede de telecomunicações e isso tudo pode ser uma vantagem. Trocar Capex por Opex pode ser vantajoso, dependendo do segmento em que a empresa atua.